25 maio 2008

Um trabalho de faculdade...

Senhores (as), faz algum tempo, na aula de Tópicos Especiais em Artes Visuais, cuja professora é a artista plástica e doutora Cristina Salgado, foi-nos requerido um trabalho prático que tratasse sobre a questão da Nostalgia, sob a ótica das nossas leituras em sala, eminentemente psicanalíticas, conduzidas pela profª artista supracitada.

Meu trabalho acabou sendo um texto, o que foi criticado de certa forma, pois um texto não tem o caráter imediato de uma obra de arte, o que eu compreendo e concordo. Eu sou um pouco preguiçoso mesmo!

Mas aqui envio o texto, para apreciação geral e etc...

Abraços,

Alexandre Marzullo



SOBRE NOSTALGIA

Começo o trabalho desculpando-me sinceramente. Sim, pois não irei conseguir realizar uma obra nostálgica ou de caráter semelhante. Não conseguirei e não quererei conseguir. Gosto de minhas lembranças? Sim. Tenho orgulho e carinho por elas? Sim. O que me impede então?

Eu me considero jovem. Tenho 23 anos, completados dia 23 de abril, e estou cursando o 5º período da faculdade de Artes. Entretanto, só passei em uma 1 matéria do 4º (fase conturbada!). Sou o primeiro de dois a vir ao mundo, tenho uma namorada e bons amigos. Minha família é pequena e tenho grandes aspirações para o futuro.

Futuro.

Futuro, presente, passado. Uns colocam o pote d’ouro à frente, outros preferem anos dourados que não voltam mais. Infância, arcádia, sucesso duradouro, dinheiro não traz felicidade mas ajuda a comprar. Tudo na base do fui e do irei; o “sou” é difícil, inconstante, evasivo. Sou implica em ser e ser pode ser lido como estar. Neste sentido, estar adquire caráter temporário, pois se estou é porque ou não estava antes ou não virei a estar depois. Ambos os raciocínios se conectam então à idéia de tempo. Mas, o que é o tempo?

Quando me lembro de determinados fatos, que me aconteceram nos anos mais jovens, não é raro sentir novamente as emoções de então. Penso também nos chamados “traumas” de guerra, as lembranças freqüentes que se freqüentam. De certa maneira, é como se, ao lembrarmos-nos, nós as revivêssemos revendo as mesmas. Me recordo, agora, de uma passagem daquele clássico livro do Arnheim (Arte e Percepção Visual), onde ele diz que ver é interpretar a realidade (algo do tipo). E interpretar é sentir. Onde está o tempo nesta equação? Quando temos acesso ao passado no presente, a partir das memórias, a linearidade temporal se dobra sobre si mesma; a ordem exata dos eventos se torna confusa e imprecisa. Com um pouco mais de introspecção, talvez ela se torne inexistente. É o que nos revela, por exemplo, o mistério da Sagrada Trindade Cristã, em que o Pai, o Filho e o Espírito Santo (um ancestral sobrenatural dos mesmos, ou a essência que perpassa de geração em geração) são a mesma e única coisa. O escritor James Joyce também abordou este tema em sua obra Ulisses, onde o personagem Stephen Dedalus versa sobre o enigma de Hamlet, de Shakespeare, interpretando o fantasma do pai como um espectro do próprio filho, o qual por sua vez não era outro senão seu pai. “Trans-substanciação, consubstanciação, mas não sub-substanciação.” Neste instante, já não tenho mais 23 anos – sou intemporal, atemporal. Sou o resultado e causa da História da Humanidade, do Mundo, da Vida ( tão mortal quanto posso ser), e quando olho para outra pessoa, eu tenho – DEVO – reconhecer nela os mesmos princípios, atributos, características que visualizo em mim. Neste caso, somos todos cíclicos, eternos e mortais.

É na morte, nosso futuro próximo, que encontramos a afirmação mestra da vida, nosso presente imediato. Pois se onde há vida há morte, então onde há morte deverá existir, necessariamente, vida. Todos os povos conheceram esse bio-dogma – os mitos do Eterno Retorno (dilúvios, juízos finais, reencarnação/metempsicose, etc.). Curiosamente ou não, todos eles também tiveram um mitológico e/ou suposto passado idílico (Era de Ouro, Éden, Arcádia, etc.); onde está o Presente, o Filho que é o Pai, gerado pela Mãe-Consorte sob os céus arquidivinos?

Viver é aceitar todos estes valores, que são muito mais temíveis e terríveis do que penso conseguir expressar ou conceber. Viver o presente é a tarefa mais difícil possível ao Homem, pois dizer sim – aceitar – implica em negar o “não”. Nós não podemos escolher sem realizar renúncias. Por isso, finalmente, não posso fazer um trabalho sobre Nostalgia. Não quero me sentir nostálgico, porque quero meu presente comigo aqui agora, meu presente que é meu passado e meu futuro em mim que sou pai, filho, espectro e pó de mim mesmo. Dizer sim, a não-ação que atua, é confiar no Absoluto Transcendente-Imanente, Deus, Cosmos Universo, é se reconhecer como impotente perante a força da vida. Que sou eu senão tudo que vivi? Como posso fazer um trabalho sobre nostalgia, quando estou vivendo tudo e todos aqui e agora? Todo o tempo todo deste mundo templo de Deus eu abarco com meu peito em humilde memória. Se pretendo dizer sim e afirmar a potência da vida, amor fati, então preciso dizer não ao sentimento nostálgico, idealista, conservador. Pelo menos por enquanto, onde ainda me sinto ousado (leia-se jovem!) para ousar. Dizer sim é entender-se a si e a vida, o mundo como um sistema aberto, voltado à transcendência. Uma vez que o entendimento de si mesmo só se torna possível com o reconhecimento e portanto, aceitação de nossas idiossincrasias, aceitar-se, portanto, é entender a vida, uma vez que somos todos o todo.

Dizer sim.

Dizer sim é atravessar os limiares escuros carregado de dívidas existenciais, dizer sim é amar verdadeiramente: amorosamente. É desistir da pompa e da glória, é aceitar a dor sem mistificá-la. Um exercício de nobreza, dizer sim é. Um grande e longo suspiro em êxtase. Viver


3 comentários:

  1. ahmm...essas cores...=Z

    hehehehe

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  2. Você se acha preguiçoso por escrever? rsss...

    Eu tenho é preguiça de escrever assim. Não sei se é preguiça ou falta de paciência mesmo. E já fui muito criticada por isso.

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  3. Alê!
    muito bom!!! adoro essas transgressões que eu mesma não tenho muita coragem de fazer!

    semana passada eu fiz um texto baseado em outro texto (do Danto) em que eu dizia, quase sem querer, que o debate em si já é arte. hoje, é.

    na verdade, eu falava sobre a reflexao em cima de um objeto de arte, que no seu caso seria 'inexistente'. mas não é, pensando bem... se usamos qualquer material livremente, palavras valem e então, é arte. eu disse.

    :D

    só não sei se concordo que há vida na morte, necessariamente... talvez eu nao tenha entendido essa parte... saudades de você, amigo!

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