É o seguinte: eu quase nunca posto então pra compensar quando posto jogo logo um pedardo de 3000 caracteres. Se alguém tiver paciência de ler e criticar: Estamos aí!
Enfim, segue abaixo a critica de dois espetáculos que assisti e que tiveram os seus releases divulgados aqui:
Espetáculo: Zona de Risco
Zona de Risco foi um espetáculo realizado numa curta temporada pela UERJ, no teatro Noel Rosa, coordenado e dirigido pela professora Doutora Nanci de Freitas. O espetáculo foi montado a partir de fragmentos de alguns roteiros e do Poema Sujo de Fernando Pessoa. Juntamente com os alunos, num roteiro de colagem e numa elaboração colaborativa, a peça foi montada com o intuito de abrir debate sobre a violência. Em cima da carta manisfesto do movimento “Rio de Paz” a maior parte da peça fala de temas como violência urbana, medo e caos.
Assisti ao espetáculo três vezes – de fato foram 4, mas na primeira apresentação não pude a experienciar de fato pois estava como o operador de som -, e em cada uma delas pude perceber diferenças na resposta do público. Na primeira vez, tive a minha egoísta experiência, pois não a compartilhei com ninguém. Apenas assisti a peça com a maior atenção que pude. Foi desgastado pelo tema e pelas imagens exibidas. O espetáculo se dividia em atos não demarcados concisamente, mas em movimento de transições onde antes de exato fim de um o outro já dava o seu começo.
Esteticamente isto contribui na materialidade da peça e na sua apreciação. Pois nos atordoa na medida do tema em voga. O primeiro ato acontece em torno de uma única personagem: Malicius. Este se apresenta como um ser do mau, ou do mal. Um “U” ou um “L” modificam como cada pessoa entende a personagem a frente. Pois podemos o entender como um subserviente da maldade - aquele que faz mal-, ou como o próprio Mau - aquele que promove o mau nos outros para que esses façam maldades (uma espécie de vírus, doença).
Os dois atos seguintes se difundem numa plástica performance, onde os atores representam vozes como avatares –no sentido de que não estão atuando, ao mesmo tempo em que também não estão sendo eles mesmo, é apenas a voz num corpo-. Onde frases poéticas, ou jornalísticas são lançadas a platéia enquanto é montado um pano vermelho a volta do palco. O pano delimita a próxima ação (o Ato III).
Assim, em seguida uma música envolve todo o Ato III. Não há falas, não há um discurso, há apenas uma perseguição: dois homens vão atrás de uma mulher. Ambos vestem-se como seres urbanos (sendo os homens num traje com referencia a bandidos – meia calça na cabeça-). A perseguição aumenta conforme o ritmo da música, passamos de uma batida percussionista a Vivaldi (Spring). Quando, num extremo cansaço a atriz cai ao chão, em seguida um pano preto a envolve, uma rosa é posta em sua mão. O palco escurece, apenas um foco no palco. Um silêncio perturba a cena por demais cansativa, quando uma estática de rádio rompe o teatro e um vídeo é projetado.
O vídeo pode ser considerado como o Ato IV, ou uma transição. Ele fala por si ao jogar em cortes violentos cenas de todo tipo brutais: armas, guerras, filmes de ficção, desenhos animados, estupro, explosões. O som é perturbador.
No fim do vídeo, o foco da atriz é desfeito a mesma se levanta e saí enquanto uma luz –simultaneamente- lavanda entorpece todo o palco. Uma fumaça inebria o ambiente enquanto uma pequena luz, vinda de uma lanterna, a invade. É o Ato V, onde o espetáculo nos dá um tempo para respirar. Uma cena calma, bem narrada. Um guarda noturno nos conta de suas rondas, de não dormir mais por insegurança. Plasticamente linda.
Ele sai do Palco, as luzes do teatro acendem – O momento é de CAOS – grita um dos atores que agora está no meio da platéia, algemado. Ele anda em direção ao palco, e conforme seus passos seguem ao destino, as luzes se apagam e um foco quadrado se acende a nossa direita. Está tudo escuro. Só vemos o foco quadrado, o ator, um outro foco se acende e agora podemos ver os outros três atores que estão sentados em cadeiras. O ator do foco quadrado se venda, e os atores sentados levantam jornais ao ponto de não vermos mais os seus rostos. Mais uma performance acontece. O ator do foco vendado se debate como se estivesse numa prisão feita de luz. Uma prisão impalpável. Imageticamente poético. Ao acabar a primeira parte de sua performance, ele cai no chão e recita a letra de uma música – fato que eu só soube mais tarde- do Rappa.
Ao término do recital as luzes se acendem – em fade – enquanto os três outros atores começam a ler notícias que estão no jornal. Notícias de violência apenas. A saturação de notícias enlouquece um deles – CHEGA! Vou embora daqui! – que se distância e pega uma mala.
Este é o início do Ato VI. A atriz arruma a sua mala enquanto faz um poema sobre suas lembranças do lugar de onde ela vai embora. Os outros apenas a observam sentados. Um rosa toma conta do palco, dando um ar romântico a cena. Essa é mais uma cena para se respirar. O que nos leva a pensar num espetáculo de estruturação Aristotélica, onde se tem 3 atos principais. O início, o meio e o fim. Entre um e outro existe a peripécia, ou o gancho. Abordado nesse espetáculo nos momentos mais calmos – como esse. Logo, imaginasse que o espetáculo já esteja perto de seu fim.
A atriz continua a sua performance, ela já está com um véu de noiva em sua cabeça e retratos de suas lembranças foram espalhadas pelo palco. Ela vai em direção a uma das escadas de saída do palco, uma das que vai de encontro a platéia – Foge comigo esta noite? Pelo Brasil, Salve, Salve – e desce as escadas. Janis Joplin é quem nos dá agora a sua presença na música Cry Baby.
Os que sobraram no palco recolhem cabisbaixos as fotografias espalhadas. Joplin continua sua performance no playback, três focos são postos no palco. Os atores colocam uma cadeira em cada um deles. Joplin vai desaparecendo e dá lugar ao que será o ápice da peça. Um ganido do que vemos depois ser a máquina de fumaça nos assusta. Os atores estão com olhares perplexos. Não se movem. A nuvem toma conta de todo o palco, mais um ganido. De súbito eles começam a se movimenta. Cada um tem uma série especifica de movimentos feita com a sua cadeira. Uns rápidos, outros dramáticos, alguns simples, mas cada movimento nos tira a centralidade do palco que já está totalmente escuro. Vemos apenas os focos e os atores. Há som com suas cadeiras no chão do palco. Até que o barulho de um sino funesto, de um vendaval complementa a performance. Agora quem entra em cena é ninguém mais ninguém menos que Wagner com sua ópera Walkirias.
O som é altíssimo e pequenos trechos do apocalipse são citados em off. Até que a música abaixa e uma cena real é narrada. Os atores paralisam até que se acaba a narrativa e Wagner retoma a cadencia dos movimentos. Pequenos trechos de colagens de relatos da primeira e da segunda guerra mundial são jogados ao público que apenas o pode escutar. Até que todos paralisam, e a atriz entra como a besta do apocalipse.
Um pouco teatral demais para uma peça que vinha num tom performático demais, mas não deixa de ter o seu valor.
Ela retira um dos três atores e as luzes se acendem. Com exceção de um ator. Não há mais nada no palco. Ele recita, não como ator, nem como personagem, mas como um simples cidadão, o “manifesto Rio de Paz” e sai. Em off começam a ser ditos nomes de pessoas que morreram brutalmente. Os atores cobrem todo o palco com um enorme plástico preto. E saem...
É o fim da peça.
Essa foi a minha primeira experiência com a peça, e o público aplaudiu a saída dos atores. Fiquei pensando se de fato a havia algo a ser aplaudido ali. Enfim, na segunda vez, não houve aplausos e pude presenciar o choro de um ou outro espectador. Um silêncio fúnebre estava estampado na face do público nesse dia. Na terceira vez, nem um nem o outro. Alguns ficaram surpresos, outros saíram discutindo, algumas perguntas eram jogadas ao vento – Acabou?-, mas também não ouve aplauso, apenas a dúvida se era ou não para aplaudir.
Espetáculo: Conexões Dançantes.
O espetáculo de dança Conexões Dançantes organizado pela professora Maria Lúcia Galvão e pala Faculdade de Dança Angel Vianna, propôs um ambiente misto de danças. Encontramos nele desde da música eletrônica até a mais clássica. Envolvendo companhias de dança de diversos estados do Brasil, a mostra trouxe a UERJ um pouco de repertório sobre a atual produção de dança em outras universidades.
Sendo uma curta temporada de dois dias os quais participei dos dois, pude apreciar a dança. Como todo espetáculo, imagino eu, houve partes as quais não foram de um grande apreço de minha parte. Em contra partida outras me embriagaram com sua beleza.
Em primeiro se faz necessário realizar que o palco e as luzes, a parte cênica e técnica do espetáculo, se encontravam muito bem arranjadas. O chão do palco tinha sido revestido por uma espécie de plástico branco a qual dava uma imensidão as cores das luzes gelatinosas. Assim um pequeno amarelo, tornava a cena clara e tomava conta de todo o palco. As músicas também estavam em um bom volume e audíveis, sem distorção.
O espetáculo inteiro se deu entorno de pequenos sketches, me levando a pensar na idéia de um CD player. Pois não havia conexão de fato entre um e outro. Não que isso seja ruim ou bom, não estou julgando com juízo de valor, apenas apresentando o que vi.
Algumas apresentações foram ofuscantes, elas apagavam, com o seu brilho, umas outras um tanto quanto esmaecidas. Não por um trabalho mal feito, mas por envolver uma questão com o corpo e com a performance que ia além de simples sincronia de movimentos.
Gostaria de ressaltar aqui a última parte do espetáculo, a última cena em si. Ela ocorreu depois de uma pequena performance dos técnicos para retirar o plástico branco que encobria o palco (detalhe interessante é que algumas pessoas acreditaram que isso fazia parte do espetáculo – mas isso entra em outra discussão). Após o palco voltar a ser pura madeira, o show apresentado foi sapateado.
Duas meninas se apresentavam no palco, ambas com vestidos similares. Elas se entre olhavam e trocavam as vozes de seus calçados num ritmo um tanto quanto lento. Elas conversavam com seus passos e sorriam uma para a outra. Estavam em sintonia e logo tomaram do público o seu silêncio e atenção. Inclusive de mim. Eu fui tomado pela beleza de uma delas. Esguia e loira sapateava com grande destreza e acuro. Algo envolvia a sua performance que me fez ser totalmente hipnotizado por ela. A outra, para mim, praticamente se perdeu e tornou-se mera coadjuvante. O ritmo aumentava e a dança se tornava ainda mais interessante. Os movimentos mais difíceis vindos dela eram transmitidos com uma simplicidade – como se fosse fácil. Não havia nada mais de som eletrônico apenas o acústico de seus pés.
Enfim: acabou. Os aplausos romperam todo o teatro, realmente foi a parte mais forte de todo o espetáculo – logicamente deixado para ser a última apresentação. Ele foi fechado com “chave de ouro”. As luzes se acenderam, todos os que participaram do espetáculo foram ao palco pegar os agradecimentos. Não consegui encontrar dentre eles a menina a qual me encantei. Por fim, todos já estavam por sair. Eu que era amigo de uma das participantes fiquei um pouco mais para parabenizá-la pelo ótimo espetáculo.
Cumprimentos a parte, um certo tempo foi passando quando o comentário “essas foram as meninas que sapatearam” me tomou a atenção. Elas estavam irreconhecíveis e tragicamente não consegui reconhecer a que me chamou a atenção. De imediato relembrei da Heidegger quando em seu livro “A origem da Obra de Arte” toma os termos Terra e Mundo como a materialidade da obra e o seu campo semântico, respectivamente e sucintamente. Lá estava eu, momentos antes embriagado pela beleza de uma delas que em sua materialidade da dança, do sapateado me levou a um estado sublime da arte (aí está o Mundo, o seu campo semântico). Logo depois, ao fim do espetáculo, ela, que havia me encantado, agora sem sua Terra e sem seu Mundo não era mais nada. Passara a ser uma simples mortal, e deixou a sua imortalidade apenas para o palco. Toda a sua aura – só para citar Benjamin – estava perdida, não havia mais potência.
Esse é o fantástico poder da arte. Aquilo que transforma borrões em paisagens, chinelos em quadros, mictórios em esculturas e o corpo na própria obra. Fora de sua institucionalização, certas coisas, como esse ser, já não tem mais sentido nem beleza.
31 julho 2009
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wow. realmente, amigo... eu li alguns dos 3000 caracteres e achei bem interessante. prometo ler com mais calma, mas tenho dois comentários a fazer: o chão branco chama piso de linóleo, tem outras cores mas o pessoal da Angel pediu branco. ficou lindo mesmo. o segundo é que as danças eram realmente desconectadas, era uma coletânea de trabalhos bem diferentes, e a conexão do nome era mais devido à união da uerj, do kinesis e da fac. angel vianna. fiquei muito muito muito feliz em ver você postando aqui! eu tenho muito apreço por este blog e pelas palavras de vocês! agora, bora pro bar! bjooo
ResponderExcluirÉ bom saber que se chama piso de Linóleo e que tem outras cores... vou usar quando estiver fazendo alguma outra produção lá ^^ (óbvio que não serei eu a pagar - hahahahaha). QUe bom que vc tem apreço pelos meus pequenos posts ¬¬. Prometo postar mais... mais caracteres...
ResponderExcluirQuando eu digo que vou postar é pq vou postar. O meu problema é ser suscinto...
BORA!!
=*